segunda-feira, 4 de agosto de 2014

A moral delxs e a ética militante.

Trostskistas e weberianos talvez sintam se familiarizados com o título desta postagem, uma alusão irreverente às suas respectivas obras “A moral deles e a nossa”¹ e “A ética protestante e o espírito do capitalismo”²... mas aqui não trataremos do significado político destes dois autores. Não. Aqui iremos tratar da importante relação entre o espírito e a luta, isto é, o pessoal e o político.

Um diálogo sempre complicado para marxistas é este entre o subjetivo (o pessoal, o individual, o emocional) e o social (o objetivo, as relações político-econômicas em escala global).

Bem, vamos à questão... As mulheres do “Womens Liberation”³ na segunda onda do feminismo (década de 1960 nos EUA) trouxeram uma importante constatação para todos os movimentos que se dizem libertários: O PESSOAL É POLÍTICO.

A ideologia (segundo a concepção marxiana) penetra na esfera subjetiva e se torna algo tão intrínseco ao ser social que se torna dele o reflexo ao passo que é dele o substrato. Pois se existe machismo, ele se manifesta nas pequenas emoções que ocorrem no íntimo dos indivíduos antes mesmo de se tornar externo na violência doméstica e na desigualdade salarial entre gêneros. E assim também com o racismo e a homofobia. Assim também com a subalternização da classe trabalhadora. Assim como todos os pressupostos que fundamentam as relações sociais na sociedade burguesa e patriarcal.

Que pressupostos são esses? Sabemos, sem pestanejar, discutir a mais-valia, sabemos discutir a exploração, o machismo e a homofobia (...será?). Mas sabemos discutir a honestidade? Sabemos discutir o companheirismo? Sabemos discutir coragem e comprometimento?

Ora, é claro, se me permite o velho Leon
“que [...] não nos venham dizer que o escravagista que com mentira e violência aprisiona o escravo está, diante da moral, no mesmo plano que o escravo que com a mentira e a violência quebra os seus grilhões.”
Invoco aqui esta passagem para que de uma vez não pareça que aqui faremos referência a uma moral, uma ética derivada de falaciosos e decadentes conceitos oriundos de uma tradição judaico-cristã. A moral de que falaremos não é a delxs. Aqui falaremos da nossa! Falaremos da ética militante.

Não confundiremos a violência do opressor com a resposta do oprimido. Isso, porque falamos aqui àquelas pessoas que dizem estar do mesmo lado da luta, aquelas que dizem estar à esquerda, entre os revolucionários comprometidos com a emancipação do ser humano.

Primeiramente, em e entre nossas organizações temos a tarefa de extinguir práticas que reproduzam o ethos da sociedade opressora contra a qual nos opomos. É nosso dever primário aniquilar o racismo, o machismo, a homofobia e o elitismo em nossos grupos de atuação e entre eles. Se tais práticas opressoras não valem em nós nem entre nós, quem dirá contra elxs (elxs = opressorxs). Não podemos ser nós mesmxs, xs libertários, aquelexs que oprimem! Acho que isto já é algo relativamente claro para as organizações e militantes sérixs da esquerda.

Entretanto, venho aqui elucidar sobre algo já colocado lá atrás: a moral do patriarcado capitalista também é permeada por outros elementos nocivos como a desonestidade, a irresponsabilidade, o egoísmo, a ignorância, o descompromisso e a covardia. Esses elementos também são ideológicos e merecem ser também combatidos entre nós.

Militantes comprometidxs com o empoderamento da classe trabalhadora e com a libertação humana não podem incorrer em práticas inescrupulosas, práticas essa que, para além de soarem como uma mera ofensa a pessoalidade de cada um, são na verdade a reprodução e perpetuação do ethos opressor do capitalismo. São ainda mais: um verdadeiro favor para os grupos dominantes, pois tratam de destruir qualquer coesão entre os movimentos de luta.

A ética militante deve ser diferenciada sim. Se não for, seremos iguais àqueles que combatemos. Seremos traidores ou no mínimo hipócritas . Nosso compromisso maior deve ser com a verdade, o sectarismo tolo é debilitante, só demonstra falta de coragem, ignorância e egoísmo. As divergências são importantes pois a crítica elucida, mas precisamos saber lidar com elas tomando-as segundo as suas devidas proporções sem emocionar o que é racional e sobretudo, mantendo-nos fieis aos nossos princípios norteadores.

É verdade, não podemos nos furtar de endurecer! Mas sem nunca perder a ternura, sem nunca perder a fidelidade para com os nossos ideais.

O socialismo é a sociedade onde vigora a liberdade uníssona à solidariedade.

Solidariedade... lembrem-se disso!


[1] TROTSKY, Leon. A moral deles e a nossa. In: Marxismo Vivo nº 13, p.63-73. Editora Sundemermann. São Paulo, 2006.
Link para acesso: https://www.archivoleontrotsky.org/download.php?mfn=7078
[2] WEBER, Marx. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Editora Pioneira, São Paulo, 1996.
Link para acesso:
http://www.nesua.uac.pt/uploads/uac_documento_plugin/ficheiro/8db98cff48151daf946fe625988763bfb0737c7e.pdf
[3] Para saber mais sobre a segunda onda feminista, recomendo essa série do programa Makers sobre o “Women’s Liberation”:
Parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=XcH2ppft2Gw
Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=aAic_v6L7N0
Parte 3: http://www.youtube.com/watch?v=rkFv1Y_lKa0

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